Na música Força Estranha, Caetano Veloso nos inspira a escrever sobre os 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em vigor desde julho de 1990, por meio da Lei nº 8.069/1990, que estabelece os direitos e deveres para os quais foram fixadas medidas especiais de proteção e assistência a serem executadas, conjuntamente, pela família, comunidade e poder público.
“Eu vi um menino correndo/ Eu vi o tempo brincando ao redor/ Do caminho daquele menino”
O ECA, em seu artigo 15º, define que a criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. Ao longo desses 30 anos, podemos ver muitos meninos e meninas correndo e brincando em projetos sociais, acesso à educação e saúde. Podemos ver também as famílias de muitas crianças e adolescentes serem beneficiados pelos programas de transferência de renda, como bolsa família, alguns com oportunidade de lazer e cultura.
Por outro lado, nesses 30 anos são muitas as histórias de avanços e desafios na implementação do ECA e efetivação do mesmo através das políticas públicas. Muitas crianças e adolescentes seguem sem condições básicas de sobrevivência. Eles são vítimas de várias formas de violências, como a violência sexual, psicológica, física, negligência, discriminação pela cor da pele, convivendo com o racismo estrutural, em muitas instâncias, e com a violência letal, que é maior entre os adolescentes.
“Eu vi a mulher preparando outra pessoa/ O tempo parou pra eu olhar para aquela barriga/ A vida é amiga da arte”
Ver uma mulher preparando outra pessoa, olhar para uma barriga e reconhecer, através do artigo 8º, que é assegurado a todas as mulheres o acesso aos programas e às políticas de saúde da mulher e de planejamento reprodutivo. Também que é garantido às gestantes uma nutrição adequada, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
Importante perceber nesses trechos da música e nas referências legais apontadas do ECA que, em três décadas, ele continua alvo de recorrentes críticas e polêmicas. Mas, ao olhar para o histórico das crianças e adolescentes do Brasil, ele se faz necessário para minimizar a desigualdade social e educacional as quais nossas famílias, sobretudo as mais vulneráveis, estão expostas.
Paulo Freire destaca as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, portanto deve ser assegurado a esse público sua participação e opinião no processo de construção coletiva das regras na família, na escola, nos projetos e nos grupos sociais que frequentam. O autor ressalta que “não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”. A educação e a forma de relação que estabelecemos com crianças e adolescente hoje faz ressonância no futuro.
Portanto, vamos fazer dessa força do ECA o nosso fortalecimento das políticas para crianças e adolescentes. Vamos ressoar: “Deixem as crianças, e não lhes proíbam de vir a mim, porque o Reino do Céu pertence a elas” (Mt 10,14). Que nesses 30 anos do ECA, possamos continuar acolhendo em nossos projetos sociais as crianças e os adolescentes para uma vida em abundância com justiça e paz.
Por Marinete Morais, agente da Cáritas Regional Minas Gerais
Fonte: Cáritas Brasileira