A Paróquia de Nossa Senhora de Fátima, sediada no Bairro Vila Tanque da cidade de João Monlevade, foi criada por Dom Marcos Antônio Noronha em 30 de maio de 1966, mas pode-se dizer que sua história começou alguns anos antes, quando se instalou a Paróquia de São José Operário, em 1948, empossando-se como primeiro pároco o Cônego Dr. José Higino de Freitas.
Com efeito, o jovem pároco Pe. Dr. José Higino de Freitas, zelosamente registrara no Livro de Tombos da nova paróquia, fatos que resumem essa caminhada. O testemunho do Cônego Higino, que ele próprio chama de a “pré-história da paróquia da Paróquia de São José Operário”, informa os nomes, gestos e ações dos primeiros ministros da Igreja que se puseram a caminho no trabalho de evangelização e formação cristã dos primeiros moradores de Monlevade: Pe. Pinto, Pe. Levy, Cônego Domingos Martins e Pe. Almir. Registra tambéma informação de que, em princípio, sua estada em Monlevade teria caráter provisório.
Isso, porém, não aconteceu. Prosseguindo o trabalho de seus antecessores, identificou-se tanto com a cidade que acabou aqui fixando raízes e se transformando numa das personalidades mais significativas de nossa história. Na qualidade de segundo Capelão-Cura, consolidou o processo de preparação da criação da paróquia, não só cuidando dos assuntos do templo que seria sua sede, mas providenciando a constituição de Comissões para construção de Capelas nas comunidades mais distantes: Vila Tanque, Carneirinhos e Cruzeiro Celeste.
No caso específico da Vila Tanque, é preciso ressaltar que, em 1947, quando se criou aquele bairro, onde moravam, inicialmente, mais ou menos umas duas mil pessoas, o jovem Padre Higino, antes mesmo de tomar posse como Pároco, pediu a Dom Helvécio Gomes de Oliveira, arcebispo de Mariana, autorização para ali celebrar missas aos domingos, ao que foi respondido, como consta no Livro de Tombos da Paróquia, “como pede, desde que seja em algum galpão ou barracão, nunca (missa) campal”. O Padre Higino providenciou, então, a construção de um Palanque, ou seja, uma pequena área coberta, onde se celebrava a missa todos os domingos.
Na realidade, era um grande barracão situado exatamente naquela área onde está hoje o campus da Funcec (atual Doctum). É provável que desde aquela época, houvesse a celebração da Santa Missa toda semana neste Palanque. A Igreja São José ficava relativamente longe das residências operárias de Vila Tanque, o que demandava um certo sacrifício do povo para acompanhar as solenidades religiosas.
Tempos depois, já em meados dos anos 50, além da missa dominical, havia também uma grande movimentação no mês de Maria, com barraquinhas e coroação de Nossa Senhora pelas crianças da comunidade. Celebrava-se também, com bastante pompa, a festa de São Sebastião a cada janeiro, precedida de novena e, como não poderia faltar, havia barraquinhas com participação do povo. No dia da festa, 20 de janeiro, uma procissão muito concorrida percorria a Vila Tanque morro acima, ruas enfeitadas de bandeirolas, com Banda de Música. Parece-me que São Sebastião seria, inicialmente, o padroeiro previsto para a comunidade. Posteriormente, com a instalação da paróquia, em 1966, a comunidade teve Nossa Senhora de Fátima como padroeira.
Em 1965, já com os preparativos para a criação da nova paróquia em andamento, foi criada a Diocese de Itabira. Assim, foi Dom Marcos Antônio Noronha que criou a paróquia, em 30 de maio de 1966, com território totalmente desmembrado da Paróquia de São José Operário, tendo em vista, como diz o documento, “o bem que adviria da multiplicação dos agentes da pastoral e o estímulo para a santificação dos féis mais afastados da Igreja paroquial, por causa das distâncias“. A Paróquia instalada em 1966 compunha-se de três comunidades: Vila Tanque, a mais densamente povoada, Areia Preta e Baú.
A construção e mesmo a localização da Igreja foi alvo de não pequenas discussões à época. Enquanto alguns sonhavam com uma Igreja mais próxima do antigo Palanque, outros questionavam a localização do altar-mor, desfocalizado da atenção dos fiéis, por estar situado entre as duas entradas principais do templo. Embora a arquitetura do templo não fosse algo que chamasse a atenção, a simplicidade de sua estrutura e a rusticidade de seu acabamento não deixaram de testemunhar o cuidado da nova comunidade em construir sua sede paroquial.
Da criação da Paróquia até hoje, foram muitos os sacerdotes que a administraram, cada um com sua maneira pessoal de ser, mas todos imbuídos do mais alto espírito missionário e apostólico, comprometidos com a difusão do Reino de Deus e a santificação dos fiéis. É muito irregular a linha de tempo da administração dos Párocos, com mudanças muito frequentes. Além do mais, com o esvaziamento populacional do centro histórico industrial, ocorrido nos anos 70 e 80, a Diocese entregou o serviço administrativo e ministerial a um mesmo ministro, que se responsabilizava pelas duas paróquias do entorno da Usina : a de São José Operário e Nossa Senhora de Fátima. E houve ainda o imbróglio do período do ministério do Padre Filipe, que acabou confluindo na criação de paróquia ortodoxa no território da Paróquia de São José Operário. Tentemos, no entanto, uma sistematização:
Nestes quase 54 anos de Paróquia muito se tem feito administrativa e pastoralmente para que a Paróquia Nossa Senhora de Fátima caminhe em sua missão de fazer crescer o Reino de Deus nesta cidade. Tudo isto graças ao zelo de seus párocos e a administração e trabalho de uma equipe de leigos atuando nas diversas áreas. Que Deus abençoe todos os padres que já passaram por nossa Paróquia e dê forças ao Pe. Jefferson Cruz Veronês no seu pastoreio.
A Paróquia Nossa Senhora de Fátima, em João Monlevade, abrange 3 comunidades com os seguintes horários de missa:
DEVAGAR COM O ANDOR, QUE O SANTO É DE BARRO!
“Devagar com o andor, que o santo é de barro!” – Todos conhecem o provérbio que a sabedoria popular nos legou e que nos apela para a prudência, sugerindo-nos nada resolver apressadamente sem pensar nas conseqüências…
Pois bem, trago aqui esse adágio para resgatar uma situação que vivi na Vila Tanque, lá pelos idos de 1963, ocasião em que pude constatar que, na procissão, literalmente, o andor deve ser conduzido com cuidado, pois o santo é de barro.
Antes é preciso dizer que em 1947, quando se criou aquele bairro, onde moravam, inicialmente, mais ou menos umas duas mil pessoas, o jovem Padre Higino, recém-chegado a Monlevade, pediu a Dom Helvécio, arcebispo de Mariana, autorização para ali celebrar missas aos domingos, ao que foi respondido, como consta no Livro de Tombos da Paróquia, “como pede, desde que seja em algum galpão ou barracão, nunca (missa) campal”.
O Padre Higino providenciou, então, a construção de um Palanque, ou seja, uma pequena área coberta, onde se celebrava a missa todos os domingos. Na realidade, era um grande barracão situado exatamente naquela área onde está hoje o campus da Funcec. Em meados dos anos 50, acompanhei como coroinha o Padre Higino nas celebrações dominicais naquele local. Depois da missa, a gente tomava um caprichado café, ora na casa de Dona Santa e Sô Delvo Pessoa, ora na casa do Sô Manuel Nunes Vera. O padroeiro era São Sebastião – pelo menos havia uma grande festa dedicada a esse santo a cada janeiro – mas havia ainda grande movimentação no mês de Maria, com barraquinhas e coroação de Nossa Senhora. Aproveitava para visitar meus tios que moravam na Vila Tanque, ali mesmo na Rua 16, e me recordo de ter assistido a algumas coroações feitas por minha prima Vera Lúcia Michel, sempre acompanhada de sua melhor amiga Delma Pessoa (hoje Arthuso).
Lembrança puxa lembrança e acabei perdendo o fio da meada. O fato a que me reporto aconteceu com certeza em janeiro de 1963. No final do ano anterior, eu havia concluído no Seminário de Mariana o curso de Humanidades (equivalente ao atual ensino médio geral), e o ato oficial de formatura era a Recepção da Batina. Era, portanto, a primeira vez que eu vinha a minha cidade vestido de batina. Era domingo, a comunidade celebrava a Festa de São Sebastião, e eu estava por ali, provavelmente em visita a meus tios que moravam na Vila Tanque. Com a Procissão marcada para as cinco da tarde, compareci empertigado, trajando minha batina novinha em folha.
Formaram-se as fileiras de fiéis, e a procissão tomou a direção do alto da Vila Tanque, ao som de hinos religiosos. No final da procissão, vestindo opas vermelhas, vinha a Irmandade do Santíssimo Sacramento, comandada por José Ricieri, o homem de confiança do Padre Higino ali na comunidade. Em seguida, o andor com a imagem de São Sebastião, e depois, o padre. Posicionei-me como acólito ao lado do Cônego Higino.
Aí aconteceu algo que até hoje não consegui explicar. O Cônego Higino, numa atitude surpreendente, coloca sobre meus ombros a capa de asperges vermelha e diz: “Hoje é você quem vai presidir a procissão. Agora você já está de batina, é bom ir-se acostumando… Vou ficar por aqui aguardando a volta da procissão e depois celebro a missa”. E lá fui eu morro acima, atrás do andor, repentinamente promovido de acólito a oficiante.
Num primeiro momento, fiquei bastante assustado: eu acabara de completar dezoito anos – nem barba na cara tinha direito – e de repente me vi sob uma responsabilidade que pesava mais que aquela capa que eu portava. A procissão andando. E um se assustava: “Meu Deus, que padre novinho! Será que o Padre Higino mandou para a procissão o chefe dos coroinhas ?” E outro explicava: “Espera aí, gente! É o seminarista lá de Monlevade, o filho de Sô Luiz e Dona Inhá!” E uma beata completava: “Benza-o Deus! É mesmo o nosso Dadinho! Mas como ele leva jeito! Tão sério, tão compenetrado, vai mesmo ser padre. Vamos ter nosso primeiro padre! Deus ouviu as nossas orações!”
A procissão andando. Tendo ouvido os comentários de aprovação, comecei a crescer dentro daquelas vestes sacerdotais. Sentia-me um verdadeiro padre… Padre, não! Eu já me imaginava bispo! A procissão subiu a rua, dobrou à esquerda, pegando a Rua 08 e, novamente à esquerda, retomou a Avenida Contorno, em direção ao Palanque. A essa altura eu estava dono da situação e, normalmente tímido e de olhos baixos, agora já arriscava olhar um pouco mais para a frente e para o alto, curtindo o papel que estava vivendo.
A procissão começou a descer a Avenida Contorno. Casas enfeitadas com gosto pelo povo fiel. Fieiras de bandeirolas atravessavam a rua de um lado para outro. Os carregadores do andor não perceberam uma fieira de bandeirolas um pouco mais baixa, interceptando a imagem. Forçaram. Aí aconteceu o imponderável: a imagem se soltou, caiu e se quebrou…
O incidente fez com que eu também despencasse do terceiro céu onde já me encontrava. “Meu Deus! Que maçada! Logo comigo e na minha primeira vez!” – pensei comigo, ainda sem saber como proceder. Todos se voltaram para mim, esperando a solução.
Conferenciei rapidamente com Sô José Ricieri, procurando uma saída honrosa. Voltei-me para os carregadores: “Olha, gente, sem imagem não tem procissão. Arrumem os cacos aí no andor do jeito que der e vamos prosseguir”. Imaginem como foi difícil equilibrar a cabeça do santo em cima do andor, morro abaixo, em direção ao Palanque!
Mas o difícil mesmo foi encarar as pessoas à chegada da procissão. Por mais piedosos que fossem os fiéis, diante de situação tão hilária, não havia como conter o riso. Entre constrangido e decepcionado, relatei rapidamente o ocorrido ao Cônego Higino, conferindo com ele se teria tomado a decisão certa. Como era de seu feitio, ele apenas riu um pouquinho, aquele riso discreto, para dentro, e concluiu: “Ora, meu filho, não se preocupe. Você acabou de aprender, na prática, que a gente tem que ter cuidado com o andor, pois o santo é de barro”. E foi celebrar, incontinênti, como de costume, a santa missa.
Até hoje, entretanto, não me saiu da cabeça que era eu o santo de barro que o Cônego Higino colocou no andor antes do tempo, sem ter tido o devido cuidado…